Três mulheres, um apartamento aconchegante cheio de memórias e uma poltrona de couro. Um drama interessante sobre o luto, a ausência e o que permanece. Palavras contraditórias. Geralmente temos a certeza de que se algo ou alguém se faz ausente, não existe presença. Entretanto, “As Três Filhas”, de Azazel Jacobs, nos mostra que essas palavras podem coexistir nas relações familiares.
Narrativa simples, talvez comum, porém com diversas nuances. Três irmãs distantes se juntam no apartamento apertado onde viveram, para cuidar de pai, que está em seus últimos dias de vida. O marcante da obra é essa distância, esse estranhamento natural entre três mulheres que juntas cresceram e por uma força maior se afastaram. Irmãs que não sabem quase nada da vida uma da outra. Irmãs ausentes. Irmãs enlutadas. Irmãs permanentes.
Personalidades completamente distintas, que no inicio, nos são apresentadas por meio dos cenários do apartamento; uma parede branca, um sofá junto de um abajur e uma bela decoração. Dessa forma são descritas Katie, Rachel e Christina. A mais velha; um fundo alvo, realista, pessimista, sóbria. O assento com a luminária; a irmã do meio; deprimida e perdida. A caçula, que transmite conforto, amabilidade e otimismo. É intrigante perceber o cuidado com os detalhes de Azazel na produção do longa, pois até mesmo os nomes das mulheres são ditos em momentos distintos, expondo sua vulnerabilidade aos poucos. Christina, Rachel e Katie. É interessante notar nisso, à medida que os nomes são revestidos de individualidade, o que reforça o caráter humano.
A ambientação transmite esse aconchego da casa dos nossos pais, porém um eminente desconforto reina no relacionamento entre as protagonistas. Incômodo este que separa e gera desentendimentos. Essa falta de conexão entre elas está bem ali, mas ninguém quer resolvê-la, até porque é muito mais fácil apenas “ir levando a vida”.
O elefante branco no meio da sala.
As Três Filhas é uma cura familiar. Assistir ao filme é como estar numa sessão de terapia. Laços rompidos pelo tempo que não volta mais, entretanto, ainda unidos pela doença. O maior questionamento dessa obra é: “O que será da nossa relação quando o papai se for?”
Esse problema é abordado durante toda a exibição; o medo discreto de perderem uma a outra, o orgulho que tenta a todo momento dizer que elas não precisam se acertar. A falta de respostas em saber quem elas verdadeiramente são como família. Uma vida na morada que se torna ausente e indiferente. Distante. Irmãs que se enxergam pelas aparências, pelo bom lar que construíram, por seus empregos, por seus cigarros e por suas apostas. Pessoas que convivem, mas não se conhecem. A família mais próxima devia ser a que mais conhecemos, todavia, não é sempre assim que acontece. Na maioria das vezes, as casas estão cheias, mas com paredes ocas e quase apodrecendo. As Três Filhas de uma forma delicada, quase humorística, exibe esse assunto, mas sem esconder o quão pesado ele pode ser.
“É bom que sejamos nós. Da maneira que deve ser. A maneira como ele gostaria que fosse.”
Mas no final de tudo, o que sobra é o amor. Mesmo tão próximas, mas tão distantes, o que as une ali, não é somente a doença, mas o amor por Vincent, seu pai. O pai que esteve com elas ali, naquele apartamento em Nova York até que ficasse apenas ele e uma de suas filhas. Onde a paternidade se une a solidão.
O filme nos ensina que a morte é transmitida através da ausência. Porém, o engraçado é que a falta não parece tão nítida no momento da perda de Vincent, afinal, elas tinham uma a outra. No entanto, esse afastamento é presente no quase óbito de um relacionamento de anos entre irmãs que já foram próximas algum dia.
Em suma, As Três Irmãs me fez chorar bastante e entrou na minha lista com cinco estrelas, com cenários familiares e confortáveis, um elenco ótimo, bons diálogos e boa reflexão. Recomendo que o assista em uma tarde de chuva com cobertores e pipoca ao lado. E claro, não se esqueça do lenço.
As Três Filhas (2023) Dirigido por Azazel Jacobs.
Onde assistir: Netflix.
Mariah Macedo.